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Serginho Neglia

Políticos ou bonecos de ventríloquos?

Atualizado: 13 de ago. de 2020


Essa semana o conceituado publicitário Fábio Bernardi que, juntamente com o Marcos Martinelli, é considerado um dos mais competentes marqueteiros políticos dos pampas, cujo o fato de estar a frente de uma campanha já garante uma expectativa de sucesso, escreveu um belo artigo em Zero Hora (goo.gl/tBTamX) em que aponta para o enfraquecimento das ideologias na política, da dicotomia entre direita e esquerda, que segundo ele  “serve para as páginas de jornais, não anda na rua, não compra pão e nem vai na manicure.” E que, “entre esquerda e direita, o eleitor escolheu a realidade.”


Fábio Bernardi tem razão em grande parte de suas afirmações, afinal, elas são analises baseadas em muita pesquisa, pois hoje, não se diz nenhuma palavra em programa eleitoral sem que tenha sido testada antes. Os políticos de hoje são verdadeiros “bonecos de ventríloquos” de seus marqueteiros. Não vestem uma roupa, não dizem uma palavra ou fazem um gesto sequer sem que esteja de acordo com as orientações de seus “gurus”. Por isso, é possível eleger um prefeito em Porto Alegre, cujo o partido é mínimo e que elegeu apenas um único vereador, uma presidenta que nunca havia concorrido a um cargo eletivo antes e um empresário que diz que não é político.


Realmente, para o povo pouco importa se o cara é de direita ou esquerda, pois como dizia Tim Maia, com a ironia que lhe era peculiar, “aqui prostituta se apaixona, cafetão tem ciúme, traficante se vicia e pobre é de direita.” Se a grande massa da população soubesse compreender o que significa direita e esquerda, e quais os interesses que cada uma representa, provavelmente os resultados seriam diferentes, por outro lado, como exigir do povo aquilo que nem os militantes dos partidos sabem. Vivemos um período de grande alienação política, disfarçada de engajamento.


O artigo de Fábio Bernardi nos faz crer que o eleitor “evolui” para além da compreensão do político quando diz que “As redes sociais, a velocidade da informação, a sobreposição de fatos e versões e o poder transformador do celular, tudo isso gerou um eleitor que evoluiu mais rápido do que os políticos e os analistas”. Neste trecho de uma certa forma ele justifica a importância, cada vez mais premente, de se ter alguém que saiba “compreender” o eleitor, alguém que saiba traduzir suas angustias, suas reivindicações e necessidades. Talvez isso explique porque, cada vez mais, as campanhas eleitorais são dominadas pelos marqueteiros.


Segundo Zero Hora, a Jornalista Tânia Moreira (ao centro), liderou o marketing da campanha de Nelson Marchezan Júnior, sob conselhos dos publicitários Alfredo Fedrizzi (a direita) e Fábio Bernardi (a equerda). (Oficialmente na campanha de Marchezan só há o registro da empresa de Tânia e nenhum vínculo aparente com as empresas dos dois publicitários que são citados como os responsáveis pelo Marketing do Prefeito eleito de Porto Alegre, porém não oficialmente)

Muito antes de qualquer estratégia, da escolha de um candidato a vice, ou qualquer outro movimento, alguém que postule uma candidatura ao executivo necessita determinar quem será o seu “guru”, o responsável pelo marketing político, que lhe auxiliará a tomar as decisões, inclusive de qual o perfil ideal para seu candidato a vice, quais os partidos mais apropriados, enfim, tudo que venha a contribuir para que o “projeto” possa ser vitorioso.


A vitória de um candidato, nos tempos atuais, depende muito mais da sua competência em compreender alguns fatores que são apontados por ele quando diz que “Dentro da ideologia da realidade, votar Luciana e Marchezan é dos votos mais lógicos desta eleição, mas isso alguns jamais perceberão, cegos pela leitura politizada e distante da vida comum do cidadão comum… Enquanto analistas, jornalistas e militantes apontam falta de coerência, o cidadão nem enxerga que ela esteja faltando e pouco se importa com isso.”


Dentro da “Ideologia da Realidade” defendida brilhantemente por Fábio Bernardi no artigo, está decretado a total irrelevância para as diferenças ideológicas. Assim como Gilberto Freyre nos fazia pensar em “Casa Grande e Senzala”, que não haviam diferenças, que vivíamos em uma “democracia racial” onde todos eram iguais, frutos de uma natural miscigenação, hoje a nova ideologia nos diz que são todos iguais, que não há diferença de Marchezan para Luciana, de Bolsonaro para Freixo, de Raul para Melo, de Lula para Alckmin, são tudo “farinha do mesmo saco”.

Assim como nunca achei que é tudo igual entre brancos e negros neste país, e que esse emparelhamento sempre serviu as elites para se livrar da culpa dos séculos de exploração, também não acho que seja tudo igual na política, e esse nivelamento “por baixo” só serve ao conservadorismo, àqueles que defendem os privilégios de uma minoria as custas do sofrimento da maioria do povo.


Esse embaçamento na visão da maioria da população favorece em muito a figuras nefastas que, sem compromisso nenhum com a coerência, se disfarçam, sob o competente manto do marketing, para se fazerem passar como defensores do povo, quando na verdade são seus algozes.


Em seu epílogo, Bernardi parafraseia, segundo ele, “uma famosa citação de James Carville: “é a realidade, estúpido”.” O que creio seja a síntese perfeita de seu artigo. Eis a realidade diante de nossos olhos, uma realidade que reconheço, pois, nos últimos anos, desde que retornei a política, percebo que conhecimento, trajetória, integridade, de nada adiantam se não conseguir transmitir isso as pessoas, “não basta ser, tem que parecer”, e vou mais longe, faria uma atualização desta frase: “Se parecer, não precisa ser”. Portanto, sei que “é a realidade, estúpido”, mas lamento que ela seja assim.



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